Por Paulo Ivo Rodrigues Neto, advogado especialista em Direito Civil e Empresarial
O objetivo do presente artigo é apresentar alguns aspectos gerais sobre a prescrição tributária. Pretende-se esclarecer pontos frequentemente mal compreendidos — ou mesmo desconhecidos — por empresários, sem, contudo, esgotar o tema.
O texto aborda, de forma geral, os institutos da prescrição e da decadência, sem adentrar nos prazos específicos de tributos quanto à suspensão ou interrupção.
A prescrição e a decadência representam a perda do direito da Fazenda Pública de exigir seu crédito por meio da execução fiscal. São, portanto, formas de extinção do crédito tributário, conforme previsto no artigo 156, inciso V, do Código Tributário Nacional (Lei 5.172/1966):
Art. 156. Extinguem o crédito tributário:
(…)
V – a prescrição e a decadência.
Ambos são institutos de direito material, previstos entre os artigos 189 e 211 do Código Civil de 2002. Referem-se à perda do exercício do direito ou da pretensão após determinado período.
Conceitos Preliminares: Interrupção, Suspensão e Fato Gerador
Antes de discutir a prescrição em si, é necessário compreender alguns conceitos importantes: interrupção, suspensão e fato gerador (nascimento da obrigação de pagar tributo).
- A interrupção da prescrição ocorre quando se verifica alguma das causas previstas no artigo 202 do Código Civil. Nesses casos, o prazo prescricional deixa de correr e recomeça do zero quando cessada a causa interruptiva.
- A suspensão da prescrição, por sua vez, paralisa o prazo sem zerá-lo. Quando cessada a causa suspensiva, o prazo retoma do ponto em que parou.
- O impedimento atua de forma semelhante à suspensão, mas com uma diferença importante: o prazo nem sequer começa a correr enquanto durar a causa impeditiva. Em resumo, a prescrição não corre contra incapazes, ausentes em serviço público e militares em tempo de guerra.
O que é Prescrição?
A prescrição é um mecanismo legal que visa garantir a segurança jurídica, limitando a duração dos litígios. Conforme ensina Anderson Schreiber:
“A prescrição e a decadência têm o intuito de impedir a eternização de conflitos na vida social, extinguindo posições jurídicas que seus respectivos titulares não façam valer após certo lapso temporal.”
(SCHREIBER, 2018, p. 285)
De acordo com o art. 189 do Código Civil:
“Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.”
No âmbito tributário, a prescrição está prevista no art. 174 do CTN:
Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.
Parágrafo único. A prescrição se interrompe:
I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal;
II – pelo protesto judicial;
III – por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;
IV – por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor.
A contagem se inicia com a constituição definitiva do crédito. Para tributos sujeitos a lançamento por homologação, isso ocorre com a entrega da DCTF, GFIP ou documento equivalente, conforme a Súmula 436 do STJ:
“A entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal constitui o crédito tributário, dispensada qualquer outra providência por parte do fisco.”
Prescrição Intercorrente
Prevista no art. 40 da Lei 6.830/1980 (LEF), a prescrição intercorrente ocorre durante o processo de execução, quando não se localiza o devedor ou não há bens penhoráveis.
Após 1 ano da suspensão, inicia-se automaticamente o prazo de 5 anos da prescrição intercorrente. O juiz pode reconhecer a prescrição de ofício, conforme o § 4º do art. 40 da LEF.
Pedidos Administrativos e Prescrição
ATENÇÃO !!!
Segundo a Súmula 625 do STJ:
“O pedido administrativo de compensação ou de restituição não interrompe o prazo prescricional para a ação de repetição de indébito tributário de que trata o art. 168 do CTN nem o da execução de título judicial contra a Fazenda Pública.”
Decadência: Perda do Direito de Constituir o Crédito
A decadência refere-se à perda do direito de o Fisco constituir o crédito tributário, ou seja, de realizar o lançamento. As regras gerais estão nos artigos 150, §4º, e 173, I, do CTN:
- Art. 150, §4º: 5 anos a partir do fato gerador (tributos com lançamento por homologação com pagamento).
- Art. 173, I: 5 anos a partir do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado (tributos sujeitos a lançamento de ofício).
Súmula 555 do STJ:
“Quando não houver declaração do débito, o prazo decadencial quinquenal para o Fisco constituir o crédito tributário conta-se exclusivamente na forma do art. 173, I, do CTN.”
Contraponto: Limites também ao contribuinte
Assim como a prescrição e a decadência limitam o poder do Estado de constituir e cobrar créditos tributários, também operam contra o contribuinte que deseja reaver valores pagos indevidamente ou exercer direitos perante o Fisco.
O Código Tributário Nacional prevê que o contribuinte tem o prazo de cinco anos para pleitear a restituição de tributos pagos indevidamente, conforme o artigo 168:
Art. 168. O direito de pleitear a restituição de tributo prescreve em cinco anos, contados:
I – na hipótese de cobrança indevida, da data da extinção do crédito tributário;
II – na hipótese de pagamento antecipado de lançamento por homologação, do fato gerador do tributo.
Esse entendimento também é reforçado pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e pelas Súmulas 625 e 546 do STJ, que estabelecem que pedidos administrativos não suspendem nem interrompem o prazo prescricional para ações de repetição de indébito.
Portanto, o mesmo rigor aplicado ao Estado deve ser observado pelo contribuinte. A inércia — tanto de cobrar quanto de requerer a devolução de valores — pode levar à perda do direito pela prescrição, encerrando qualquer possibilidade de atuação judicial ou administrativa.
Conclusão
A prescrição e a decadência, apesar de semelhantes, aplicam-se em momentos distintos:
- Decadência: ocorre antes do lançamento, impedindo a constituição do crédito.
- Prescrição: ocorre após o lançamento, extinguindo o crédito já constituído.
Ambos garantem segurança jurídica e previsibilidade, mas a correta aplicação depende de análise técnica do caso concreto.