Por Paulo Ivo Rodrigues Neto

A Inteligência Artificial já não é mais “coisa de futuro” no universo forense. Ela está presente na investigação digital, na análise de imagens e áudios, na triagem de volumes massivos de dados e até no apoio à redação de documentos técnicos. Em pouco tempo, escritórios e peritos que dominarem o uso seguro e validado dessas ferramentas terão uma vantagem real: mais precisão, mais velocidade, mais clareza probatória, menos risco.

Mas existe um ponto central que frequentemente fica de lado: IA sem procedimento é risco. E, em perícia, risco não é apenas “erro técnico” — risco é nulidade, é quebra de cadeia de custódia, é prova contestável, é viés invisível, é perda de credibilidade.

Este artigo apresenta o que a IA pode (e não pode) fazer na prática forense e por que a formalização de um POP/SOP (Procedimento Operacional Padrão / Standard Operating Procedure) é hoje a forma mais segura de transformar tecnologia em prova robusta.


O que a IA já pode fazer (bem) na perícia

Quando usada como ferramenta assistiva, a IA tem se mostrado especialmente útil em cinco frentes:

1. Triagem e organização de dados externos (e-discovery)
Classificação automática, busca semântica, deduplicação, identificação de padrões e priorização de itens relevantes em casos que envolvem grandes volumes: celulares, nuvens, e-mails, logs corporativos, backups, redes sociais.

2. Construção de linhas do tempo e vínculos entre evidências
A partir de fontes diversas, a IA ajuda a correlacionar eventos, horários, contatos e deslocamentos, criando hipóteses investigativas mais rápidas e consistentes.

3. Análise assistida de mídia (imagem, vídeo e áudio)
Realce de imagens, detecção de frames críticos em CFTV, reconhecimento de padrões visuais, redução de ruído em áudio, separação de locutores e alinhamento de transcrito, sempre preservando o original e a rastreabilidade do processo.

4. Documentoscopia e perícia em conteúdo digital
Apoio na comparação de grafia, suspeita de adulteração, inconsistências de compressão, metadados, sinais de manipulação em documento ou mídia.

5. Detecção de deepfakes e mídias sintéticas
Uma área que cresce rápido e exige instrumentos atualizados para distinguir material autêntico de material fabricado.

Em todos esses casos, a IA funciona como amplificador de capacidade humana, não como substituto do raciocínio pericial.


Onde os problemas começam

Na prática, os maiores riscos surgem quando a IA é usada sem um procedimento formal de controle. Os exemplos são comuns:

  • ferramenta “de mercado” aplicada sem validação local;
  • modelo atualizado sem revalidação;
  • resultados apresentados como certeza, sem taxa de erro;
  • pipeline não documentado;
  • evidência sigilosa processada em nuvem sem critérios;
  • decisão final “terceirizada” ao algoritmo.

Isso cria uma situação perigosa: o resultado até pode ser bom, mas a prova fica frágil. E prova frágil não se sustenta contra um contraditório bem estruturado.


Limites éticos e probatórios: a regra do “assistivo, validado e auditável”

Existe um consenso técnico e normativo emergente no mundo jurídico e forense:
IA pode apoiar, mas não pode decidir.

Em perícia, isso vira uma tríade simples:

(1) Assistivo

A IA sugere, destaca, organiza, mede, prioriza.
Quem conclui é o perito.

(2) Validado

Sem validação adequada (com dados representativos e métricas claras), o modelo não é método pericial confiável.

(3) Auditável

Tudo precisa ser reconstituível:
o que entrou, como foi processado, qual versão do modelo, quais parâmetros, quais saídas, quais limitações.

Sem auditabilidade, não há prova — há apenas opinião maquinizada.


POP/SOP: o “freio de segurança” que transforma IA em prova forte

POP/SOP não é burocracia. É blindagem.
É o instrumento que garante que o uso da IA:

  • respeita cadeia de custódia;
  • é reprodutível;
  • tem métricas e margem de erro;
  • preserva o contraditório;
  • reduz vieses;
  • protege dados sensíveis;
  • sustenta o laudo em juízo.

Um bom POP/SOP define, com precisão:

  1. Objetivo do uso da IA
    (triagem? realce? mensuração? clusterização? detecção?)
    E o que é proibido fazer com ela.
  2. Ferramentas autorizadas e versões aceitas
    incluindo registro obrigatório de atualização.
  3. Fluxo completo de análise
    entrada → processamento → validações → saídas → verificação humana → laudo.
  4. Critérios de validação técnica
    datasets, métricas, limites de aplicação, testes contra baseline humano/convencional.
  5. Procedimentos de registro e evidência
    logs, hashes, preservação de original, anexos de audit trail.
  6. Regras de transparência no laudo
    como descrever a IA, como reportar incerteza, como apresentar erro esperado.
  7. Protocolos de segurança e LGPD
    ambiente, criptografia, retenção mínima, descarte seguro.

Benefícios reais para peritos e escritórios

Para o perito, um POP/SOP reduz risco operacional e aumenta credibilidade técnica.

Para o escritório, ele é ainda mais estratégico:

  • melhora a previsibilidade da prova técnica;
  • dá segurança para contrapor laudos adversos;
  • organiza assistentes técnicos e consultores;
  • acelera triagem de casos e diligências;
  • diminui a chance de nulidade ou impugnação bem-sucedida;
  • fortalece o discurso da prova, porque ela é metodologicamente “fechada”.

Em síntese: não é só sobre usar IA. É sobre usar IA sem abrir flancos.


elaboração de POP/SOP de IA aplicado à perícia

A partir dessa necessidade crescente, ofereço a elaboração completa e personalizada de POP/SOP para uso de IA na prática forense, voltada a:

  • peritos judiciais e extrajudiciais;
  • institutos e laboratórios;
  • escritórios de advocacia (para padronizar atuação com assistentes técnicos e perícias privadas);
  • equipes de compliance investigativo.

O que entrego

  • POP/SOP escrito e diagramado com fluxograma operacional;
  • anexos técnicos por tipo de perícia (digital, vídeo, áudio, documentos, biometria etc.);
  • matriz de risco e validação (métricas, limites, revalidação);
  • modelo de seção de laudo para transparência do uso de IA;
  • guia rápido de contraditório (como sustentar/impugnar resultados de IA);
  • treinamento breve para equipe, quando desejado.

Como funciona

  1. reunião breve para entender área forense, ferramentas e perfil dos casos;
  2. levantamento do fluxo atual e pontos críticos;
  3. redação do POP/SOP com validação técnica;
  4. entrega final + ajustes.

Tudo pensado para ser aplicável no dia a dia e defensável em juízo.


Convite aos colegas

Se você já usa IA na perícia ou no suporte probatório do seu escritório, provavelmente já percebeu o ganho de eficiência — e talvez também tenha sentido a falta de uma norma clara para não “escorregar” tecnicamente.

A formalização de um POP/SOP é o passo que separa uso improvisado de uso forense robusto.

Se quiser conversar sobre a elaboração de um POP/SOP para a sua realidade, me chama por aqui.


Vamos construir um procedimento seguro, moderno e juridicamente forte, para que a IA trabalhe a favor da prova — e não contra ela.