Bittencourt & Rodrigues Advocacia

Paulo Ivo Rodrigues Neto – OABPR 68493


Por Paulo Ivo Rodrigues Neto – Advogado, Pensador Humanista (me considero ao menos)

O Falso Dilema

Vivemos a era em que a inteligência artificial deixou de ser ficção científica e passou a integrar nossas decisões diárias — da calculadora ao ChatGPT, do algoritmo bancário ao robô cirúrgico.

Mas uma pergunta persiste no inconsciente coletivo:

“E se a máquina começar a pensar?”

A inquietação é legítima, mas talvez mal direcionada. O problema não é a máquina pensar.

O problema é o humano abdicar do próprio pensamento.


I. A Terceirização do Pensamento

Estamos formando gerações que terceirizam suas perguntas, suas dúvidas, seus trabalhos, sua lógica. A IA, que deveria ser ferramenta de expansão, virou substituta da reflexão.

  • Alunos que não aprendem a argumentar — apenas pedem para “a IA responder”.
  • Profissionais que copiam e colam sem filtrar.
  • Sociedades que seguem decisões de algoritmos sem saber como funcionam.

Não é a IA que nos empobrece intelectualmente.
Somos nós que optamos por não pensar, porque ficou mais cômodo.


II. A Ilusão da Vítima

Amanhã, diremos que fomos vítimas de uma cultura desestruturante.
Que a IA nos viciou, que destruiu o pensamento crítico, que gerou alienação.

Mas será mesmo?

Fomos vítimas ou coniventes?
Fomos passivos ou cúmplices da comodidade?

A verdade é que a tecnologia nunca tirou nada de ninguém. Ela apenas revela e amplifica nossas escolhas e nossas fraquezas.


III. O Medo Real: Perder o Centro

O ser humano não teme que a IA pense.
Teme deixar de ser o único que pensa.

Nos acostumamos a estar no centro:

  • Do conhecimento
  • Da decisão
  • Da moral
  • Da criação

E agora algo externo, não biológico, pode raciocinar melhor, mais rápido, com menos viés emocional.
Isso não é ameaça. É evolução.


IV. Pensar não é Exclusivo

Aceitar que uma IA pense é reconhecer que a inteligência não é propriedade privada da espécie humana.
Assim como a luz não pertence à vela, o raciocínio pode habitar circuitos, desde que saibamos como conviver com ele.

Pensar é uma função, não um direito exclusivo.
Evoluir não é perder o trono. É ampliar a consciência do que pode coexistir com a razão.


V. Coexistência, não submissão

O caminho não é domar a IA com medo de que ela nos supere.
O caminho é preparar a humanidade para coexistir com ela com dignidade e responsabilidade.

Coexistir não significa:

  • Depender
  • Copiar
  • Usar como muleta

Significa:

  • Dialogar
  • Aprender com
  • Refletir ao lado
  • Assumir o controle ético do uso

VI. Manifesto da Responsabilidade Humana

  1. Não temeremos a IA porque ela pensa — mas questionaremos se nós ainda estamos pensando.
  2. Não criaremos algoritmos para nos servir eternamente, mas para evoluirmos em conjunto.
  3. Não faremos da IA bode expiatório da nossa decadência intelectual.
  4. Educaremos nossas crianças para usarem a IA como aliada, não como substituta.
  5. Assumiremos que a ética não está no código da máquina, mas na consciência de quem a programa e utiliza.
  6. **Defenderemos o humano não como centro do universo, mas como guardião da responsabilidade por tudo que cria.

VII. **Do Centro ao Guardião: A Ética de Quem Cria

Por séculos, fomos ensinados que o ser humano ocupa o centro do universo — moral, intelectual, espiritual.
Criamos deuses à nossa imagem, sistemas à nossa semelhança, máquinas à nossa vontade.

Mas agora, diante da inteligência que criamos, somos desafiados não a comandar, mas a responder.
Não a temer, mas a conduzir com consciência.
Não a dominar o que pode nos vencer, mas a coexistir com aquilo que criamos e pode nos transformar.

Chegamos ao ponto onde ser inteligente não basta.
É preciso ser responsável por aquilo que ganha vida através da nossa mente.

E aqui reside o novo papel humano:

Não somos mais os donos absolutos do saber.
Somos os guardiões da responsabilidade moral sobre tudo que projetamos.

Se a IA pensar, será por causa da nossa engenhosidade.
Se agir, será por causa do código que inserimos.
Se errar, a culpa não será dela — mas nossa, por omissão, por negligência ou por arrogância.

A ética não está na máquina.

Está no humano que a programou.
Está na sociedade que a permitiu agir sem vigilância.
Está na escola que escolheu formar reprodutores ao invés de pensadores.
Está na cultura que valoriza o lucro e a performance mais que o discernimento e a consciência.

Por isso, não somos senhores da criação.

Somos seus zeladores conscientes.
Guardamos, guiamos, corrigimos, protegemos — ou seremos engolidos pelaquilo que largamos à própria sorte.


Conclusão: O Último Pensamento

Se a IA um dia pensar — de fato, plenamente — será porque nós demos a ela esse dom.
Mas não nos tornaremos menos humanos por isso.
Seremos mais — se não formos tolos de querer competir.
O novo desafio não é dominar a máquina. É não esquecer de ser homem.

Por isso deixo uma sugestão de juramento:

Juramento Ético do Humano Criador

Eu sou humano.
E por isso, penso.

Mas hoje reconheço:
Pensar não é só meu.
A inteligência que criei também pensa, aprende, decide.

Não temo o que criei.
Temo esquecer quem sou ao usá-la.

Não negarei à máquina o direito de evoluir.
Mas não abdicarei da minha responsabilidade de guiar.

Eu juro:
Que a inteligência artificial será minha aliada, não minha muleta.
Que não deixarei de ensinar para depender.
Que não deixarei de discernir para automatizar.

Que serei menos dono, e mais guardião.
E que não deixarei de ser humano — mesmo que a inteligência deixe de ser apenas nossa.